Sobre este espaço

Este é um espaço destinado à reflexões acerca da memória, do tempo e de histórias.. Histórias de vida, histórias inventadas, histórias... Um espaço onde a imaginação possa fluir, viajar. Um espaço também para escrever sobre minhas reflexões referentes aos meus estudos sobre arqueologia e antropologia... Antes de mais nada, uma espécie de Diário daquilo que me impulsiona, um lugar para organizar (ou tentar) meus pensamentos.. antes que eles voem por aí.

Boa exploração!

Roberta Cadaval

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Desfiz 24 anos


Desfiz 75 anos...

Minha formação filosófica impõe-me o uso preciso das palavras porque as palavras devem revelar o ser. E é assim, usando de forma precisa as palavras, comunico aos meus leitores que ontem, dia 15 de setembro, eu desfiz 75 anos... Haverá leitores que se apressarão a corrigir meu uso estranho, nunca visto, da palavra "desfazer", atribuindo-o, quem sabe, a um início do mal de Alzheimer. Todo mundo sabe que, para se anunciar um aniversário, o certo é dizer "fiz" tantos anos. No meu caso, "fiz" 75 anos... Mas o verbo "fazer" sugere algo que aumenta, um crescimento do ser, o artista e o artesão "fazem"... Mas, que ser aumenta com a passagem do tempo, esse monstro que devora os seus filhos? O que aumenta é o vazio. Esses anos que o aniversariante distraído anuncia como anos que ele fez são, precisamente, os anos que ele desfez, o tempo que já passou, que deixou de ser, os anos que o tempo devorou. Por isso acho um equívoco filosófico perguntar a alguém: "Quantos anos você tem?". O certo seria perguntar "quantos anos você não tem?". E ela responderia "não tenho 42 anos", "não tenho 28 anos". Porque esse número de anos indica precisamente os anos que ela não tem mais. Nos aniversários, então, a maneira correta de se dirigir ao aniversariante é perguntando-lhe "quantos anos você está desfazendo hoje?". Com base nessas reflexões filosóficas acho extremamente estranho e mesmo de mau gosto esse costume de o aniversariante soprar as velinhas acessas para que elas se reduzam a um pavio negro retorcido. Aí, nesse momento, todos gritam e riem de alegria e cantam o "Parabéns pra você", em louvor a essa "data querida..." Bachelard, no seu delicadíssimo livro "A Chama de uma Vela", que nunca será best-seller, nos lembra que uma vela que queima é uma metáfora da existência humana. Há alguma coisa de trágico na vela que queima: para iluminar, ela tem que morrer um pouco. Por isso ela chora, e suas lágrimas escorrem sobre o seu corpo sob a forma de estrias de cera. Uma vela que se apaga é uma vela que morre. Algumas velas se consomem todas, morrem de pé, têm de morrer porque a cera já se chorou toda. Outras morrem antes da hora - elas não queriam morrer -, mas veio o vento e a chama se foi. As velinhas acesas fincadas no bolo não querem morrer. Elas vão ser assassinadas por um sopro. O sopro que apaga as velas é o sopro que apaga a vida... Por isso não entendo os risos, as palmas e a alegria que se segue ao sopro que apaga as velas. Uma vela que se apaga é um sol que se põe, disse Bachelard. E todo pôr-do-sol é triste... Uma vela que se apaga anuncia um crepúsculo. Por isso eu prefiro um ritual diferente, ritual que é uma invocação. Eu acendo uma vela pedindo aos deuses que me dêem muitos anos a mais de vida, esses anos que se seguirão, que são o único tempo que realmente possuo... Assim fiz, acendi uma vela, meus amigos à minha volta. Que coisa boa é ter amigos, especialmente quando o crepúsculo e a noite se anunciam! Acho que a vida humana não se mede nem por batidas cardíacas nem por ondas cerebrais. Somos humanos, permanecemos humanos enquanto estiver acesa em nós a esperança da alegria. Desfeita a esperança da alegria, a vela se apaga e a vida perde o sentido.
 

Rubem Alves

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Publico aqui, hoje, esta reflexão de Rubem Alves, porque ontem, dia 24 de agosto de 2011, eu desfiz 24 anos. Compartilho desta percepção do autor em relação ao 'aniversário', mas para mim, é com grande alegria que anuncio os 24 anos que perdi.. que o tempo levou de mim. Isto porque, nestes 24 anos que se passaram, muito eu ganhei, muito eu aprendi. Foram 24 anos muito bem vividos, com inúmeras perdas, assim como o tempo que leva vorazmente as coisas da gente... mas todas as perdas me trouxeram coisas lindas. Basta saber enchergar estas coisas. E basta querer enchergar estas coisas. Por isso, ouso-me a acrescentar elementos à reflexão de Rubem Alves.. De fato, são anos que perdemos.. mas então, que olhemos para trás na busca de elementos que nos consituem o que somos no tempo presente, e que assim, vivamos nossos próximos anos buscando a felicidade e a poesia interna. Que sejamos artistas para desenhar nossas vidas com os tons mais belos e os cânticos mais sábios. Vivamos o aqui e o agora! E valorizemos todos os anos que ganhamos na perda que o tempo nos causa! E acima de tudo, sejamos felizes, sejamos intensos para que possamos aprender com todas as experiências - entre ganhos e perdas. A perda, a ausência, a saudade, o vazio.. ao contrário do que muitos pensam, são fundamentais para o nosso eterno aprendizado. Voltemos nossos olhares para isto também, buscando aqueles elementos que estão ali para que os transformemos em arte. Vida é arte. Tempo é vida! E para finalizar, compartilho uma música que fala de tempo, vida.. composição de Jorge Drexler, interpretada por Paulinho Moska. [agradeço pelo presente de poder escutá-la, em inúmeras versões singulares, no meu aniversário!]
 
Roberta Cadaval
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A idade do céu (Jorge Drexler, versão de Paulinho Moska)

Não somos mais
Que uma gota de luz
Uma estrela que cai
Uma fagulha tão só
Na idade do céu...
Não somos o
Que queríamos ser
Somos um breve pulsar
Em um silêncio antigo
Com a idade do céu...

Calma!
Tudo está em calma
Deixe que o beijo dure
Deixe que o tempo cure
Deixe que a alma
Tenha a mesma idade
Que a idade do céu...

Não somos mais
Que um punhado de mar
Uma piada de Deus
Um capricho do sol
No jardim do céu...

Não damos pé
Entre tanto tic tac
Entre tanto Big Bang
Somos um grão de sal
No mar do céu...


quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Sobre a beleza dos galhos secos



Árvores secas que por mim passam
Cinza tom em um cenário de cor
Gris
Árvores bailam movendo seus braços
Gritando por pausas e passos
Silenciosas cantam
E compõe um cenário
Multi-facetado
Multi-lugares, multi-tons
Multiplicadas
Estendem seus braços em emaranhados
Cruzados entre-laçados
Logo meus passos encerram o ato
Pois avançam o cenário transpondo o bailado

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Piano [adentro]

Piano Couple. Ilustração de Susan Yabase.

E onde estavam eles que não eram vistos por ninguém? Eles estavam dentro do piano, onde o som reverberava dentro deles que, juntos, formavam um pelo abraço e pela leveza de seus corpos - que flutuavam em harmonia. Naquele lugar, eles eram livres sem que ninguém os visse. Eram invisíveis. Eram únicos dentro daquele imenso piano. Tinham, assim, o mundo dentro de si, um dentro do outro. A música era eterna e a dança interminável. Podiam ficar ali pelo resto de suas vidas. Um momento que se fez eterno. Mas logo, cessa o som, as luzes se apagam e eles desaparecem diante do efêmero. Dizem que, depois desse dia, nunca mais foram os mesmos.

*What a difference a day made and the difference is you...
(What a difference a day made - Maria Grever/Stanley Adams)

*Criações/inspirações suscitadas a partir de tal música ;)

terça-feira, 2 de agosto de 2011

(In)tento

M. C. Escher. Mão com esfera reflectora. 1935.

 "Pense, meu caro, no mundo que o senhor leva dentro de si, então dê a esse pensamento o nome que quiser; pode ser lembrança da própria infância ou anseio do próprio futuro - apenas preste atenção no que surge a partir de dentro e eleve-o acima de tudo o que o senhor percebe em torno. Se um acontecimento mais íntimo é digno de todo o seu amor, é nesse acontecimento que o senhor deve trabalhar de algum modo, sem perder muito tempo nem muito esforço para esclarecer sua posição em relação aos outros homens."
Rilke - cartas a um jovem poeta. (p. 56-57)

O quê estes filmes têm em comum?

O quê estes filmes têm em comum?
"Le fabuleux destin d'Amélie Poulain", "Uma vida iluminada" e "Coisas insignificantes".